Vamos falar de Feng-Shui

Quando a gente começa a pensar em desenvolver a espiritualidade, junto com esse objetivo costuma vir também algo que talvez não fosse uma preocupação anterior, mas que passa a ser: o cuidado com a nossa própria energia. Daí que vêm os hábitos de limpeza e proteção energéticas, meditação, práticas de cuidado emocional e tudo o mais. Eu entendo que, num primeiro nível, nós desenvolvemos esse cuidado primeiramente com os nossos próprios corpos energéticos – o que vai nos acompanhar pelo resto da vida, mas os primeiros passos costumam ser os mais difíceis, já que tem aí uma mudança de hábitos envolvida. Depois, claro, a tendência é que esse cuidado se estenda igualmente para o lugar onde a gente mora. E o nome pelo qual a maioria das pessoas conhece as técnicas para se fazer isso é o chamado Feng-Shui.

Pois, nesse último fim de semana, eu e a Maíra fizemos o curso de Feng-Shui Prânico, ministrado no nosso Instituto Pranaterapia São Paulo pela instrutora sênior Cristina Lunardi. Por isso, eu achei que seria interessante falarmos um pouco hoje sobre esse assunto.

O grande problema, quando falamos de Feng-Shui, é que, assim como tantas disciplinas espirituais de origem chinesa, ele não existe como uma única coisa monolítica, mas na forma de diversas escolas, muitas das quais são antiquíssimas e baseadas em textos que não são facilmente acessíveis entre nós. Eu mesmo preciso admitir que não sou nenhum especialista no assunto, por isso vou incluir citações e links neste texto de figuras de maior autoridade. Como resume Stephen Skinner (que, além de especialista em magia cerimonial e geomancia, também é um mestre de Feng-Shui), “a arte do Feng-Shui consiste em prender e acumular o ch’i benéfico e defletir o ch’i maléfico do local escolhido” (Feng-Shui, de Living Earth Manual). E a ideia é basicamente isso mesmo: na raiz dessa prática, está o conceito de energia sutil (prana, qi/ch’i) e as seus muitos métodos de manipulação. Essa energia existe numa forma benéfica, em que ela é condutiva a uma vida saudável e próspera, e existe em formas destrutivas (sha qi), que é bom evitar.

A escola de Feng-Shui mais conhecida no ocidente, no entanto, é infelizmente a menos tradicional. Chamada de “Escola do Chapéu Preto”, ela foi fundada pelo professor Thomas Lin Yun na década de 1980 a partir de uma fusão de conhecimentos chineses, tibetanos e indianos. Seu principal instrumento é o diagrama Ba Gua ou Pa Kua, que distribui os trigramas de energias yin/yang e serve para dividir a casa em 9 seções a partir da porta de entrada, cada uma das quais teria certas funções (sucesso, relacionamentos, saúde, criatividade etc). Como comenta Jen Stone, em seu site, “muitos praticantes de Feng-Shui na Ásia consideram essa adaptação como inautêntica, por se desviar grosseiramente das raízes tradicionais das práticas clássicas. Com frequência seus métodos são desafiados e ridicularizados”. Pelo visto, o grande problema dessa escola, segundo a visão mais clássica, é que ela não leva em consideração alguns conceitos básicos da tradição como as direções cardeais e o layout da terra. Para piorar, ela serve de base para versões ocidentais ainda mais diluídas, frequentemente misturadas com conceitos da psicologia de Jung.

O Ba Gua/Pa Kua usado pela Escola do Chapéu Preto

A escola mais antiga do Feng-Shui é chamada de “Escola das Formas”. A origem do próprio nome Feng-Shui repousa nas palavras chinesas para vento (風) e água (水). Juntas, diz Skinner, “essas palavras exprimem o poder dos elementos fluidos do ambiente natural, e esse poder se expressa e deriva do fluxo de energia não apenas na superfície, que foi esculpida pelo vento e pela água, mas também pela terra”. Na Escola das Formas, portanto, são analisados elementos do terreno, como a presença de relevo e montanhas, rios e lagos, além de componentes humanos, como estradas, para se identificar qual é o fluxo da energia pela terra, os locais onde há pontos de energia vital mais concentrada e por onde passa a energia ruim (fontes aqui e aqui). A partir daí é possível construir um espaço adequado para a habitação em que os aspectos naturais, divinos e humanos estejam em harmonia (o que é um dos temas de grande importância para o taoísmo no geral). Os conhecimentos dessa escola são muito úteis para quem vai pegar um terreno para construir (e sem dúvida há de ter sido inestimável na antiguidade), mas para a maioria de nós que hoje vive de aluguel sua utilidade é mais limitada.

Outra escola bastante tradicional também é a “Escola da Bússola”, conhecida assim por se valer do uso de uma bússola chamada de Luopan. O Luopan contém uma agulha magnetizada dentro de vários círculos concêntricos associados a uma quantidade assombrosa de informações, com equivalências aos trigramas, os cinco elementos (Wu-Xing), as 28 mansões lunares etc. A partir daí, é possível realizar vários cálculos que explicam o fluxo de energia pela casa não apenas agora, mas ao longo do tempo (há um fator temporal também no Feng-Shui, na medida em que a energia dentro de nossa casa também está sujeita às transformações promovidas pelos ciclos cósmicos mais amplos). É importante ainda levar em consideração as energia individuais de cada habitante (o que se costuma fazer astrologicamente pela leitura do mapa natal). Como explica Skinner em Flying Star Feng Shui: “As qualidades da hora de nascimento ficam impressas nas pessoas ou construções e continuam a influenciá-las ao longo de suas vidas inteiras. Em termos muitos simples, conferir as combinações Sexagenárias [uma tabela de ciclos temporais] de uma pessoa com a da construção ajudará a indicar se o espaço será bom para ela viver ou trabalhar nele. Uma construção yang do elemento Metal, por exemplo, não seria boa para uma pessoa yin do elemento Madeira, pois Metal destrói Madeira”.

Uma bússola luopan

Quanto a Skinner, a própria escola a que ele pertence se chama Xuan Kong Fei Sin ou “Escola das Estrelas Voadoras” (daí o nome do livro que eu citei acima), uma das escolas clássicas mais populares hoje (que, pelo que eu entendi, descende da Escola das Formas). As tais “estrelas voadoras” são configurações energéticas que medem as marés de qi pela casa, na medida em que se deslocam de um cômodo para outro ao longo do tempo – assim sendo, trata-se de uma escola em que o fator temporal também é enfatizado. Por meio de certos cálculos, é possível entender onde está cada estrela pela casa em cada momento e então agir de acordo. Para quem tiver interesse, recomendo a leitura da obra de Skinner, mas aviso desde já que é uma coisa bastante complexa. Além dos cálculos em si, é preciso se familiarizar com todo o arcabouço do pensamento energético chinês, com os conceitos de yin e yang, os trigramas, os cinco elementos, o quadrado Lo-Shu etc. Existem ainda outras escolas, mas entendo que essas são as principais.

Por fim, antes de eu falar um pouco do Feng-Shui Prânico, uma inovação da escola de Pranic Healing, sintetizada pelo Mestre Choa Kok Sui, convém mencionar a versão indiana do Feng-Shui que é a disciplina chamada Vastu Shastra. Do sânscrito, com o sentido de algo como “instruções acerca do ambiente”, Vastu Shastra opera com base numa cosmologia diferente, mas o princípio é semelhante: harmonizar o fluxo de energia prânica no ambiente, remover obstruções e assim criar um espaço de saúde e prosperidade. Seu principal diagrama é a mandala Vastu Purusha, uma imagem de um homem deitado com os pés unidos. Sua cabeça fica na direção nordeste, seus pés no sudoeste, e o espaço do seu corpo é repartido em 44 divisões, conforme as várias deidades hindus. No centro está o criador Brahma. Nas quatro direções, as deidades de que já falamos anteriormente quando tratamos da magia das direções (Surya, o Sol, no leste, Varuna, deus da água, no oeste, Yam, senhor da morte no sul, Kubera, senhor da prosperidade no norte), e assim por diante. Outros conceitos relevantes são os pancha bhootas, os elementos (diferentes dos elementos chineses e mais próximos dos elementos ocidentais), e os Navagraha, os planetas (que somam nove, pois, além dos 7 planetas clássicos, são incluídos também os nodos lunares, Rahu e Ketu). Tudo isso é levado em consideração na hora de definir o que é auspicioso ou não para cada cômodo.

Mandala Vastu Purusha, tirada do livro Vastu Shastra for a Healthy, Prosperous and Happy Life, de Nidhi Jain e Ashish Jain

Comparado com as outras disciplinas, o Feng-Shui Prânico tem uma abordagem mais direta, mas, pelo que eu vi, não tem nenhuma conexão com as escolas mais New Age, modernas e diluídas, de Feng-Shui. Assim como as escolas clássicas, o Feng-Shui Prânico tem uma grande preocupação com as características do terreno e especialmente com as direções cardeais. A base desse método é o entendimento da qualidade das energias (pranas) que chegam pelas quatro direções: há direções cuja energia constrói e fortalece, outras dissolvem e enfraquecem. A gente aprende esses tipos de energia, suas cores e propriedades no Nível Avançado dos cursos de Pranic Healing, e aí é muito interessante observar isso em ação. O grande diferencial, a meu ver, é que o Feng-Shui Prânico ganha em eficácia pelo fato de confiar não apenas em cálculos ou impressões intuitivas, mas nas técnicas de avaliação de energia pelas mãos usadas pelos praticantes de Pranic Healing (eu já falei disso anteriormente aqui).

Para dar um exemplo: um conceito do Feng-Shui clássico é que um dos tipos de energia ruim é a energia de cantos e quinas. Quando uma parede tem um canto pontiagudo, entende-se que a energia, ao correr pelas superfícies da parede e se encontrar nessa ponta, forma um padrão destrutivo, tradicionalmente conhecido como “flecha envenenada”. Passar rápido por esses cantos não vai ter necessariamente um grande efeito, mas se uma pessoa ficar sentada em contato com essa flecha envenenada durante um longo período de tempo, ela vai sofrer o equivalente a um ataque energético – o que é meio engraçado de pensar, porque ataques energéticos normalmente partem de pessoas (ou espíritos), mas também dá para ser atacado pelo próprio prédio em que você está. O mesmo se aplica à mobília. Com as técnicas de avaliação energética do Pranic Healing a gente consegue medir a energia de uma pessoa normalmente e comparar a como fica quando ela se expõe ao qi de uma flecha envenenada (foi o que a gente fez em aula, aliás, e o efeito é palpável). Não precisamos apenas confiar no que os livros e professores dizem, dá para conferir literalmente com a mão.

Agora, eu não posso escrever um texto sobre Feng-Shui e não dar nenhuma dica prática, não é mesmo? Por isso vou oferecer uma palhinha para encerrar. Algumas dessas dicas vocês também podem observar em outros lugares, como no blog da Benebell Wen (que eu tenho como referência e já citei várias vezes aqui n’O Zigurate). Eu acho interessante que, embora cada escola tenha lá suas peculiaridades e formas de remediar cada possível problema, muitas dessas noções, via de regra, são bastante intuitivas e tendem a se repetir (tem até coisas que aparecem em textos sumérios, como dá para ver ao comparar com o que eu citei no nosso texto sobre as direções). Mas vamos lá:

  • Ao escolher uma casa ou apartamento para morar, preste atenção na porta de entrada. Use a função de bússola do seu celular e veja para onde a porta de entrada aponta. Se ela der para o norte ou leste, pode ir morar lá sem medo (nordeste é bom também, mas pode ser forte demais para algumas pessoas). Se for sul ou oeste (ou, Deus o livre, sudoeste), é melhor ver outras opções. Se você já mora numa casa com abertura para sul ou oeste, é possível remediar, mas aí é o caso de ir fazer o curso também. Você também marcar uma consultoria com a Maíra, que também está oferecendo esse serviço.
  • A melhor posição para dormir é com a cabeça virada para o leste.
  • Sempre que possível, evite comprar móveis com quinas pontiagudas (vide o que falamos sobre flechas envenenadas). Se já tiver móveis ou partes da casa com pontas, evite ficar na frente dessas pontas por períodos de tempo prolongado (especialmente ao dormir e trabalhar). Há formas de remediar isso, mas, de novo, aí vale marcar uma consulta para resolver esses casos individuais. E, não… não coloque também a sua sogra para dormir de frente para uma flecha envenenada de propósito quando ela vier visitar – olhe o karma!
  • Cuidado com a sua cozinha: se não tiver muito tempo para faxina, é a limpeza da cozinha que você deve priorizar. Preste atenção em especial ao fogão. Evite choques entre o elemento fogo no forno e o elemento água da pia, filtros e bebedouros (idealmente eles não devem ficar de frente um para o outro, nem perto demais. Mas, de novo, existem formas de remediar isso).
  • Cuidado com o seu banheiro: esse é o espaço por onde a energia vai embora. Não deixe nada no banheiro que não seja de banheiro. Em especial, não deixe no banheiro nada que tenha a ver com a sua prosperidade.

Para quem se interessou, recomendo ficar de olho no site do Instituto Pranaterapia e nas suas redes sociais (links aqui e aqui para os perfis do IP Brasil e São Paulo no Instagram) para ver quando a Cristina irá oferecer o curso de novo. Ele tem dois pré-requisitos: Pranic Healing Nível Básico (quem é de São Paulo poderá fazer esse com a Maíra em setembro) e Pranic Healing Nível Avançado. Na minha opinião, o curso de Feng-Shui Prânico foi profundamente instrutivo e, ao mesmo tempo, fácil de aplicar, por isso eu recomendo imensamente. No mais, como eu já falei antes, as características energéticas e espirituais de cada direção cardeal são um tema de grande interesse para mim e somar esses conhecimentos ao meu repertório me permite um entendimento mais profundo do que a abordagem mais típica da magia cerimonial ocidental que é ficar decorando correspondências.

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Para informações e inscrição nos cursos de Autocura Prânica e Pranic Healing Nível Básico que serão ministrados pela Maíra nos meses de agosto e setembro, respectivamente, favor conferir o Linktree da Maíra neste link aqui. Nesse link, também tem o contato dela para marcar suas sessões de Cura Prânica ou atendimentos com Feng Shui Prânico. Quanto aos cursos de agosto e setembro d’O Zigurate ministrados por mim, logo mais esta semana eu devo anunciar datas e valores! Fiquem de olho!

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