O texto de hoje vai ser relativamente breve e simples para os padrões aqui do site. A ideia é apenas indicar uma prática que pode ser adotada por qualquer um, mas especificamente por quem tem conexão com egrégoras herméticas e gnósticas. Talvez seja interessante também para cristãos que tenham uma certa abertura para algumas coisas, digamos, diferenciadas.
Como eu disse no texto “O que é o hermetismo?”, o hermetista contemporâneo tem diante de si o desafio de constituir por conta própria o seu repertório de práticas, já que não há nada mastigado. Ao mesmo tempo em que a gente tem uma certa base, dada a riqueza da literatura hermética, é tudo bastante fragmentado e tem muito de experimental nesse trabalho. Em vários outros textos anteriores, eu enfatizo, ao ponto da chatice, a importância para qualquer praticante de magia de ter na sua caixa de ferramentas alguma técnica de limpeza energética1, por isso é interessante começarmos por aí.
E assim eu esbarrei na fórmula PSINŌTHER NŌPSITHER THERNŌPSI, enquanto lia um post do blog do Sam Block (quem mais?), intitulado On Prayer Beads, the Number 108, and Chants for PGM and Hermetic Works [Sobre contas de oração, o número 108 e cânticos para trabalhos herméticos e com os PGM] . Diz o Sam:
A fórmula chamada de THERNŌPSI por Betz, como aparece em PGM III.186, PGM IV. 828 (a famosa Liturgia de Mithras) e (talvez) PGM VII. 216, bem como em Pistis Sophia (livro 5, cap. 136; livro V, cap. 142). Nove sílabas, permutações das três sílabas ΨΙ, ΝΩ e ΘΕΡ, que podem ser traduzidas como ‘o Deus altíssimo’ ou ‘filhos de Deus’ (…). Em PGM III, é usada como parte de uma oferenda; nos PGM IV e VII, é usada como parte de um filactério, e em PGM IV em específico, como parte de um filactério usado no processo de elevação espiritual, imortalização e revelação. Em Pistis Sophia, Jesus a usa em invocações a Deus como o Pai do Tesouro da Luz, um tipo de divindade suprema, para propósitos de perdão, purificação e salvação no processo de ascensão espiritual.

Quando Sam diz PGM, ele está se referindo, claro, aos Papiros Mágicos Gregos (já publicamos a Liturgia de Mithras aqui n’O Zigurate, inclusive, que faz parte desse material), e o acadêmico Hans Dieter Betz é o organizador da edição dos feitiços dos PGM traduzidos para o inglês. Os filactérios que ele diz são pequenos amuletos de proteção, geralmente de papiro ou de alguma folha metálica, feitos para serem usados durante rituais específicos. Já Pistis Sophia é um texto gnóstico do século III ou IV d.C., em que Jesus ensina diversos mistérios aos apóstolos após a sua ressurreição.
Quando eu li “propósitos de perdão, purificação e salvação no processo de ascensão espiritual” no texto do Sam, me acendeu uma luzinha aqui de que talvez seria possível aproveitar essa fórmula como uma técnica de limpeza energética, como um tipo de mantra a ser repetido um número de vezes por sessão. Por isso, fiz umas consultas (óbvio que eu não vou sair metendo o garfo na tomada de fazer qualquer ritual por aí sem oracular antes), medições (as técnicas de avaliar energia com as mãos da Cura Prânica são muito úteis para isso) e vi que dava para fazer. Depois, quando testei, percebi que de fato a sensação que você tem após uma série desse mantra é de frescor e renovação, parecida com o que a gente sente após um mantra budista como OM AH HUM. Ao avaliar meus chakras, reparei que eles estavam mais limpos também. E assim eu adotei esse mantra como parte das minhas práticas de rotina.
Sobre as origens dessa fórmula, Betz indica a leitura da obra de Hopfner… que infelizmente está em alemão (Griechisch-ägyptischer Offenbarungzauber é o título). Mas tem uma pesquisadora que publicou, em inglês, uma tese de doutorado de 2011 na Universidade de Edimburgo que toca nesse assunto. Seu nome é Erin M. Evans e o título da sua tese é The Books of Jeu and the Pistis Sophia: System, Practice, and Development of a Religious Group (link aqui). Evans menciona numa nota de rodapé que, segundo a proposta de Hopfner, “Thernopsi” significaria “o deus altíssimo”, “o deus mais elevado”. Mas Evans tem uma outra leitura. Ela diz o seguinte:
Uma outra fórmula merece uma breve menção aqui. A fórmula “Thernopsi” é uma série de palavras basicamente composta pela reorganização das sílabas ψι, νω, and θερ: ψινωθερ νωψιθερ θερνωψι. Ela aparece duas vezes, pelo menos, nos Papiros Gregos Mágicos, com mais uma possível ocorrência, incluindo corrupções e variantes. Psinother deriva do egípcio para “filho de Deus”. A fórmula aparece duas vezes em 4PSa [Pistis Sophia, livro IV, parte I] (…) em ambos os casos, aparece em apelos ao Pai do Tesouro da Luz (em oposição ao bom Sabaoth, o “pai” terreno de Jesus) para que ele ouça, imediatamente após uma série de permutações das letras de ιαω [IAŌ]. (…) É importante esclarecer que essas invocações não representam um nome ou nomes desse Pai mais elevado – esse nome nunca aparece por escrito. Essas listas de nomes de poder contêm os de entidades menos elevadas como Jeu e Sabaoth, o que sugere que essas palavras intencionam chamar a atenção de quem as ouve e agirem como significantes do conhecimento divino mais amplo de quem a enuncia. Não importa se era conhecida ou não a origem etimológica ou significado da expressão. Em todo caso, fica evidente que o autor sentiu que era apropriado dirigir-se à entidade mais elevada do seu sistema.
Então θερνωψι seria derivado do egípcio para “o Deus altíssimo” ou “filho(s) de Deus” e a fórmula trabalha com permutações de suas sílabas. Analisar o arranjo das sílabas é interessante, porque, se a colocarmos numa tabela simples 3×3, dá para observar que a sílaba PSI vai sendo deslocada do começo para o meio para o fim da palavra, de modo que o último elemento da cadeia, THERNŌPSI é uma inversão do primeiro, PSINŌTHER. A palavra PSINŌTHER, que começa a cadeia, também aparece na vertical, pois é grafada pela primeira sílaba de cada elemento. Em termos numerológicos, se o meu cálculo de isopsefia não me falha, a soma é 710 (PSI), 850 (NŌ) e 114 (THER), para um total de 1674. Repetido três vezes, dá 5022. Infelizmente, não tenho uma base suficiente de conhecimentos de numerologia para dizer se isso tem algum significado relevante (além do fato de que 5 + 2 +2 dá 9 e a fórmula tem 9 sílabas, o que é até interessante mas não impressiona). Quem gosta dessas coisas, no entanto, pode procurar sentido aí.

Em termos práticos, utilizar a fórmula PSINŌTHER NŌPSITHER THERNŌPSI é muito simples. Eu recomendo sentar e respirar fundo (aquela respiração de lá do baixo ventre, pausadamente, em quatro tempos), dar uma relaxada, fechar os olhos, talvez fazer aquele exercício de percepção dos corpos sutis de que falamos anteriormente. Então, com um mala nas mãos (ou usando os dedos), você canta uma sequência de 108 repetições dessa fórmula – para quem precisa de uma ajudinha, eu me gravei cantando esse mantra. A gravação está disponível em nosso canal do Telegram, mas eu também a publiquei no canal do YouTube:
Eu gosto ainda de incluir uma visualização de uma chama branca, que emerge da base da sua espinha subindo até em cima para purificar as energias mal qualificadas que estiverem nos seus corpos energéticos. Uma série de 9 repetições, com a projeção da visualização dessa chama branca a partir das mãos, também pode ser usada para a purificação de oferendas2.
Deixo, claro, o aviso de que práticas de limpeza são cumulativas e agem dentro de uma certa faixa. Nenhuma técnica é suprema e substitui todas as outras. Fazer o mantra THERNŌPSI todos os dias, com 108 repetições, vai ajudar especialmente com a limpeza de impregnações mentais e emocionais do nosso dia a dia… mas é bom, ainda assim, fazer um banho de sal ou de ervas de vez em quando, ir a um terreiro tomar um passe, receber tratamentos energéticos e assim por diante.
Por fim, aponto para o fato de que essa é uma prática que abre o chakra da coroa – você provavelmente vai sentir a cabeça leve ou pesada depois, uma leve desorientação ao abrir os olhos. Sendo assim, é recomendável encerrar com um aterramento. Se você tem interesse pelo hermetismo na prática, essa é uma técnica muito boa para somar ao seu repertório e incluir na rotina, que não é complexa, nem exige grande preparo.
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(Obrigado pela visita e pela leitura! Se você veio parar aqui n’O Zigurate e gostou do que viu, não se esqueça de se inscrever em nosso canal no Telegram neste link aqui. Anunciamos lá toda vez que sair um post novo, toda vez que abrirmos turmas para nossos cursos e todo tipo de notícia que considerarmos interessante para quem tem interesse em espiritualidade, magia e ocultismo. Se quiser se informar a respeito dos cursos, meditações e atendimentos de Pranic Healing no Instituto Pranaterapia São Paulo da Maíra, o site dela é https://www.mairadosanjos.com.br/. Também estamos no Instagram (@ozigurate e @pranichealermaira) e Blue Sky (ozigurate.bsky.social e pranichealer.bsky.social).)
- Temos um texto básico sobre o assunto aqui no site. A Juliana Ponzilacqua, do Colégio Ordo Noctuae, recentemente publicou também em sua newsletter um texto mais completo, intitulado Pequeno manual emergencial de limpeza energética para magistas e não-magistas, cuja leitura a gente recomenda muito . ↩︎
- O uso de uma prece para purificação e multiplicação das oferendas é muito usada no budismo e recomendada em rituais mágicos pelo Jason Miller (vide o Sorcerer’s Secrets/Real Sorcery). Como a fórmula THERNŌPSI, além de ser uma fórmula de limpeza, aparece num contexto de oferendas nos PGM, faz todo o sentido somar mais essa função à lista das coisas do que dá para fazer com ela. ↩︎

Que BLOG inspirador! Me apaixonei .
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