O que é remediação astrológica?

Desde que eu comecei a mexer com magia astrológica mais publicamente, o tema da remediação tem se tornado mais um de meus, digamos, interesses especiais. É um dos serviços que eu ofereço em meus atendimentos e também o tema de um dos meus cursos – Experimentos em Remediação Astrológica, que eu costumo oferecer junto com o módulo I de Magia Astrológica. A ideia é simples: são práticas que a gente pode fazer para aliviar questões complicadas em nosso mapa natal. No entanto, é ainda um tema obscuro para a maior parte do público, por isso achei que seria interessante publicar um texto para ajudar a apresentá-lo aos nossos leitores.

Para tanto, antes de mais nada, é preciso discorrer aqui sobre um conceito conhecido como dignidade essencial. A partir daí, podemos entender para que serve a remediação e em quais casos ela é recomendada.

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Em tempo, estamos com VAGAS ABERTAS em outubro para o módulo II de Magia Astrológica. O módulo I é pré-requisito para as aulas, mas é possível ainda adquirir o acesso às gravações. Também teremos um curso novo em outubro intitulado Entidades e Deidades de Cura.

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A dignidade essencial

Falando em termos extremamente resumidos: na astrologia, existe a noção de que, simbolicamente, cada planeta tem ali o seu campo de atuação, aquilo que o planeta está tentando fazer. E o signo em que o planeta cai determina os recursos que ele tem à sua disposição para isso. Naturalmente, a utilidade dos recursos que temos variam para cada situação: um martelo é útil se você quer martelar um prego, por exemplo; se você precisa rosquear um parafuso, nem tanto.

Sendo assim, um planeta pode estar mais ou menos confortável em cada signo, de acordo com os recursos oferecidos. Todos os planetas estão confortáveis no signo que eles mesmos regem, que é chamado de domicílio, porque eles estão em casa ali. É o caso de: a Lua em Câncer, Mercúrio em Gêmeos e Virgem, Vênus em Touro e Libra, o Sol em Leão, Marte em Áries e Escorpião, Júpiter em Sagitário e Peixes, Saturno em Aquário e Capricórnio. Enquanto regentes desses signos, eles encontram tudo de que precisam para se manifestar em sua plenitude.

Agora, quando o planeta está num outro signo que não o de seu domicílio, os recursos à sua disposição são outros, que podem ou não ser o que o planeta quer ou precisa. Cito a Demetra George, em Ancient Astrology in Theory and Practice (cap. 13, Planetary Reception):

É aqui que as abordagens das interpretações tradicionais começam a divergir significativamente das abordagens modernas. Em vez de dizer que a Lua em Gêmeos tem uma necessidade emocional de se comunicar e fazer contatos mentais, a abordagem tradicional diria que a Lua é uma convidada no domicílio de Mercúrio, que é o regente anfitrião do domicílio. Mercúrio fornece à Lua os recursos a partir de seu próprio balaio de significantes de Gêmeos — palavras, razão, intelecto e amigos — para realizar os seus propósitos.

Na sequência, ela continua a analogia: se o anfitrião for um parente ou amigo, próspero e generoso, o planeta vai ter o apoio necessário para funcionar direito. Se ele for um estranho ou inimigo, pobre ou mesquinho, aí o planeta se vê privado de recursos, apoio e conexões, o que dificulta a sua vida.

Em alguns signos, o planeta é como se fosse um convidado de honra, por isso ele consegue se manifestar com grande facilidade, até mesmo mais do que em sua própria casa. Áries é território de Marte e um signo de fogo, assim como Leão, por isso o Sol se sente muito confortável nele. O Sol remete à expressão do “eu”, ao modo como a gente se põe no mundo, e Áries, enquanto o primeiro signo do zodíaco, trata justamente do processo de individuação (contrastar com a dissolução representada por Peixes), por isso pode oferecer ao Sol tudo que ele precisa nesse quesito. No mais, no hemisfério norte, Áries também marca a primavera, o momento em que as horas diurnas começam a crescer.

Essa posição em que o planeta não está domiciliado, mas se regozija mesmo assim no signo, é chamada de exaltação. Mercúrio é o único planeta que se exalta num signo que ele mesmo rege, Virgem, mas os outros planetas têm todos um signo a mais que os fortalece: a Lua em Touro, Vênus em Peixes, o Sol em Áries, Marte em Capricórnio, Júpiter em Câncer, Saturno em Libra. A exaltação é um conceito muito antigo, por isso a lógica por trás dela, do porquê de serem esses signos específicos, não é necessariamente transparente. Mas, de novo, para quem quiser saber mais, recomendo a leitura do livro da Demetra.

Gráfico das dignidades astrológicas, de Chris Mitchell. No anel externo vemos cada signo. Indo de dentro para fora: na primeira camada está o regente do signo, i. e. o planeta que fica domiciliado nele. Na segunda camada, estão os planetas que se exaltam no signo; na terceira, os planetas que encontram dignidade pela triplicidade, com a cor do devido elemento, depois encontramos os termos e, por fim, os decanos.

Assim chegamos à contraparte desse princípio: se tem signos em que os planetas estão felizes, existem também os signos em que eles ficam infelizes, que são os signos opostos. Vênus fica feliz em Touro, Libra e Peixes. Seus opostos são Escorpião, Áries e Virgem. O planeta Vênus é delicado e gosta de prazer e harmonia – por isso ele não fica feliz nem nos signos de Marte, que se refestelam na guerra, nem no signo de exaltação de Mercúrio, que prefere ler um bom livro a se divertir e transar. A Lua sofre em Escorpião e Capricórnio; Mercúrio em Sagitário e Peixes; o Sol em Libra e Aquário; Marte em Touro, Libra e Câncer; Júpiter em Gêmeos, Virgem e Capricórnio; Saturno em Câncer, Leão e Áries. E existem também várias outras nuances1, mas está bom por enquanto.

É isso que a gente faz, portanto, quando avaliamos o que se chama de dignidade essencial de um planeta: estamos observando em quais signos eles ficam ou não felizes e encontram ali os recursos para agirem de acordo com sua natureza.

Para a magia astrológica, a dignidade essencial é muito importante. É por esse motivo que eu estou sempre anunciando no Telegram quando um planeta entra nesse ou naquele signo, porque um planeta dignificado (i.e. num signo que é bom para ele2) é mais útil para um feitiço ou talismã do que um planeta sem dignidade – praticamente todas as fontes de magia astrológica mais tradicionais vão afirmar algo nesse sentido. Mas o conceito é útil para todas as modalidades da astrologia, inclusive a natal. E aí entramos no tema da remediação.

Diferenças de abordagem

A maioria das pessoas chega na astrologia por via da astrologia moderna. E, assim, eu não quero promover nenhum tipo de rixa mística, nem falar mal dos astrólogos dessa vertente, mas uma boa parte desse pessoal, sobretudo a mais pop, tem uma abordagem à astrologia que é uma grande sopa de palavras-chave com ênfase em descrever personalidades. Quem fala disso explicitamente é, de novo, a Demetra George: “Na abordagem moderna, todos os planetas num mapa em particular são considerados iguais em sua capacidade de manifestar suas questões; entende-se que eles o fazem de modos diferentes, dependendo do seu signo, casa e aspectos. A interpretação envolve uma mistura de várias combinações de palavras-chave”.

O sábio Abu Mashar conduzindo um experimento astronômico, do Kitab al-Bulhan, o Livro das Maravilhas.

Como vimos, Marte, por exemplo, fica debilitado em Touro. Mas, se a gente partir desses princípios, de que a astrologia descreve principalmente questões de personalidade, de que os planetas têm todos a mesma oportunidade de se manifestar num dado mapa e de que a melhor forma de interpretá-los é por via de palavras-chave, vamos associar então o planeta Marte com a palavra-chave “ação” e o signo de Touro com “paciência”, “lentidão” e “necessidade de segurança”. É assim que a gente chega ao que se lê num site como o Café Astrology. Diz lá sobre Marte em Touro:

Pessoas de Marte em Touro valorizam a força e a estabilidade. São motivadas pela necessidade de segurança e por um gosto especial por posses pessoais. A maioria não tem medo de se esforçar pelo que deseja e há uma paciência no geral a essa posição de Marte. Se for preciso esperar alguns anos para conquistar os seus objetivos, então paciência.

Pessoas nascidas sob Marte em Touro costumam ser bastante sensuais. Algumas são mais lentas para se excitar, mas a sensualidade delas é terrena e poderosa.

Em nenhum momento, nem no trecho citado, nem depois, o texto se atenta à questão da dignidade. Eu entendo que, por um lado, existe sempre o receio de assustar os leitores com termos como “detrimento” ou “debilidade”. Mas ao tratá-lo assim, desse jeito genérico e subjetivo, fica uma brecha muito grande para as pessoas lerem e pensarem: “ah, nada a ver, eu não me identifico com meu mapa” – que é exatamente o oposto da sensação que a gente tem após nos consultarmos com profissionais de astrologia com experiência e domínio do assunto. Essa abordagem de sopa de conceitos em que cada planeta soma uma série de descrições complexas da personalidade do nativo tende também a gerar uma visão geral tão complicada que o efeito acaba, paradoxalmente, sendo mais genérico do que específico.

Contraste agora com o que diz Austin Coppock:

O planeta guerreiro, audacioso, brusco e decisivo tem pouco a ver com os pastos verdejantes do signo bovino. Na verdade, as ações naturais ao planeta tendem a ser contraproducentes, não úteis, em Touro. Marte fica lá, sentado em cima das próprias mãos, o Deus da Guerra numa festinha do chá.

Em Touro, a energia vital de Marte tende a ser sufocada, com o perigo de acabar virando uma postura resmungona e passivo-agressiva.

Num episódio do The Astrology Podcast, do Chris Brennan, com Sylvi Osland (318, Mars in Astrology), a Sylvi faz outra analogia: é como se você tivesse um monte de energia e estivesse dando um rolê num lugar onde está todo mundo relaxado enquanto você está tendo um ataque de pânico e precisa se levantar e sair correndo.

Nesse caso, tanto o Coppock quanto a Sylvi falam do planeta em termos de princípios e analogias, não descrevendo o comportamento dos nativos de Marte em Touro. Se essa pessoa vai demonstrar certas características ou não, isso vai depender do resto do mapa, da interação com outros planetas. É extremamente provável, em todo caso, que o planeta traga diversos desafios por conta dessa debilidade. Mas, de novo, quais são as áreas em que esses desafios vão se manifestar, isso vai depender do restante do mapa. Um planeta debilitado como regente da casa 1, por exemplo, pode resultar em problemas de autoestima e saúde, dificuldades para ganhar dinheiro se estiver na casa 2, e assim por diante.

A grande dificuldade ao pensarmos em dignidades essenciais num mapa natal é a tendência à hipersimplificação. Não, uma pessoa com Mercúrio debilitado não é burra e uma pessoa com uma Vênus debilitada não está condenada a ficar sozinha para sempre. No episódio do Astrology Podcast, o Chris e a Sylvi inclusive conversam sobre lutadores com Marte debilitado: eles não são lutadores piores por conta disso, mas volta e meia são underdogs e indivíduos com estilos diferentões, o exemplo mais clássico sendo Muhammad Ali, que tinha Marte em Touro e cujo lema era, muito venusianamente, float like a butterfly, sting like a bee (“flutue como uma borboleta, ferroe como uma abelha”). A dignidade dos planetas no seu mapa não é uma garantia, nem uma condenação, mas sim, de fato, um mapa, que vai indicar onde é provável que você tenha maiores ou menores dificuldades. E a partir daí a gente tem as ferramentas para poder lidar com essas questões.

A remediação propriamente

Em resumo, a remediação é isso: são as técnicas a que a gente recorre para tratar os planetas problemáticos num mapa e assim evitar que ele manifeste os malefícios decorrentes desse posicionamento ruim. E definimos o que é um planeta problemático com base na sua dignidade, como vimos.

No Head On History, o Patreon do Dr. Ali Olomi, cuja especialidade é a astrologia islâmica medieval, há várias postagens dedicadas ao tema da remediação astrológica. Como ele comenta, há indícios dessa prática já na Babilônia (onde mais?), onde encontramos receitas para tratar pacientes que sofrem de doenças e “azar” causados por certos trânsitos planetários. Essas práticas, que existem então numa interseção entre astrologia, medicina e magia, vão, com o tempo, se somar à medicina greco-egípcia (o contexto de onde nasce o hermetismo), à medicina indiana e posteriormente à teurgia islâmica. No contexto hindu e afro-asiático, que bebe dessas fontes, há uma longa tradição de remédios astrológicos, receitas indicadas para mitigar os efeitos danosos de planetas debilitados no mapa natal. Na astrologia dita ocidental, no entanto, essa é uma arte que, assim como a magia astrológica, se fragmentou, acabou se perdendo e hoje tem sido retomada. Temos alguns autores contemporâneos que têm procurado experimentar com essas técnicas num contexto mais ocidental, como o próprio Coppock, o Christopher Warnock e seu discípulo Clifford Low, e os resultados têm sido interessantes. Como a astrologia védica é uma outra tradição, bastante distinta, eu não acho que as práticas de remediação que encontramos nela sejam adequadas para nós. Mas acredito que podemos aprender muito com o que o Dr. Olomi nos ensina da astrologia islâmica.

Como eu falei anteriormente, para tratar de Saturno aflito ou de um trânsito ruim, uma das fontes que o Dr. Olomi cita recomenda escrever o nome divino Al-Qadir (o Onipotente) num pedaço de papel num sábado ao amanhecer, aí embrulhar com o papel um grão de mirra junto de três sementes de papoula e jogar num fogaréu. Outros remédios incluem banhos, perfumes e unguentos (um banho para uma Lua debilitada inclui hortelã, manjericão e água de coco, por exemplo), talismãs, mudanças de comportamento, rituais e recitações de nomes divinos. Warnock e Coppock são também grandes promulgadores da técnica da caridade astrológica (uma doação prometida e feita com certa regularidade para alguma organização que cuide de assuntos ligados ao planeta a ser remediado). Nem todo planeta debilitado exige remediação – como o Dr. Olomi fala, o diagnóstico é, por si só, uma arte à parte, – mas é difícil que uma técnica de remediação venha a ter efeitos deletérios.

A remediação pode ajudar demais com nossas questões do dia a dia, mas é especialmente recomendável quando o assunto é magia planetária. Na medida em que a dignidade de um planeta em nosso mapa é indicativo da nossa relação com esse planeta nesta encarnação, é mais fácil obtermos resultados positivos com feitiços e talismãs dos planetas que se encontram dignificados (ou, pelo menos, não debilitados). Uma pessoa com Vênus debilitada em seu mapa que faça um ritual de Vênus ou então construa/adquira um talismã venusiano pode não obter os efeitos benéficos desejados. Clifford Low afirma até que, nesses casos, os resultados podem ser explosivos – Warnock não chega a tanto e prefere o termo “imprevisíveis”, o que talvez seja um eufemismo3. Em todo caso, a remedição permite contornar essas possibilidades e abre o leque de planetas com os quais podemos trabalhar de modo produtivo.

Se o assunto te interessa, recomendo os vários autores que eu citei ao longo deste texto para se aprofundar. Eu também te convido a assistir ao meu curso Experimentos em Remediação Astrológica. Eu já abri uma turma este ano para a aula ao vivo, mas o material está gravado. E, caso queira orientações personalizadas para tratar do seu próprio mapa natal, as instruções para os meus atendimentos estão neste link.

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  1. Um planeta que não esteja nem dignificado, nem debilitado por conta de seu signo é chamado de peregrino. Alguns autores consideram essa condição neutra e outros a entendem como uma debilidade pequena. Mas tem também outras possibilidades: um planeta pode estar dignificado pela sua triplicidade, pelo seu termo ou decano (sobre os decanos, conferir este texto aqui). Gêmeos debilita Júpiter, por exemplo, mas o primeiro decano do signo (até 10º) é regido por Júpiter, por isso os nativos de Júpiter no primeiro decano de Gêmeos se safam desses efeitos mais deletérios. ↩︎
  2. Existe também a dignidade acidental, que trata das outras coisas que podem acontecer com um planeta que o enfraquecem ou fortalecem. Um planeta nas casas 1, 4, 7 e 10 ou na casa de seu júbilo estão mais fortes do que planetas em casas cadentes (3, 6, 9, 12). Um planeta muito perto do Sol acaba queimado, e assim por diante. ↩︎
  3. Na caixinha do Instagram, alguém perguntou ao Dr. Ali Olomi se é tudo bem usar um talismã de um planeta debilitado no mapa natal. A resposta que ele dá é que não faz mal, mas os antigos “normalmente combinavam com remediação antes, sobretudo com os quadradinhos mágicos, que se acredita que servem para estabilizar a influência e tornar o talismã eficaz. Sem a remediação, o uso do talismã pode ser inconsistente”. ↩︎

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